Conhecimentos tradicionais, autonomia e cotidiano: reflexões sobre a Teia dos Povos e suas
articulações tecidas na luta por terra e território.
Teia dos Povos – Movimentos Sociais – Articulações Territorializadas
Este trabalho busca apresentar e discutir o processo de construção da Teia dos
Povos, um espaço de articulação de movimentos sociais que surge em 2012, no sul
da Bahia, tendo como mote a luta por terra, território e agroecologia. Criando
conexões entre diferentes atores sociais, a Teia é atualmente composta por
“pescadoras, marisqueiras, ribeirinhos, povo de fundo e fecho de pasto, povos de
terreiros, pequenos agricultores, sem-terra, sem-teto, indígenas de muitas nações,
quilombolas, povo negro, extrativistas e os muitos elos que apoiam e constroem a
Teia a partir da solidariedade” (TEIA DOS POVOS, 2019). As relações tecidas nessa
rede afirmam a busca da unidade na diversidade como um de seus princípios, ao
lado da construção da autonomia que acompanha a luta por território, direcionando
os projetos e ações que vêm sendo traçados para as comunidades que participam
de sua composição. Esta pesquisa se propõe a analisar essas dinâmicas, discutindo
os processos de participação política e construção democrática na perspectiva das
redes de movimentos sociais, a partir dos sentidos atribuídos pela Teia dos Povos às
relações entre território e autonomia. Além da análise documental do acervo da Teia,
a investigação tem como ponto de partida a experiência de construção de um
calendário agrícola, possibilitando a aproximação com uma das comunidades da
Teia dos Povos, o que permitiu observar na prática como as ações territorializadas
desenvolvem-se e conectam-se com os projetos mais gerais dessa rede.
Direcionando o caminho metodológico percorrido na investigação e seguindo os
princípios da pesquisa participante, o calendário agrícola carrega a proposta de
escutar, sistematizar e materializar os saberes de agricultores que guiam suas
atividades de cultivo por métodos tradicionais, integrando-se aos projetos da Teia de
valorização e disseminação dos conhecimentos tradicionais dos povos e
comunidades que participam de sua rede. Nesse processo, examino como o
calendário agrícola porta sentidos específicos de autonomia, ligados à dimensão do
cotidiano dos movimentos sociais, em aspectos vinculados às práticas e
conhecimentos localizados no dia a dia do trabalho com a terra e da luta pela
manutenção no território. Ao enfocar os sentidos da relação entre território e
autonomia e os contornos específicos que adquire na Teia dos Povos, é possível
ainda observar como essa rede apresenta-se em sintonia com outras articulações de
lutas territorializadas latino-americanas, partindo de experiências que afirmam a
construção de outros mundos possíveis, com suas práticas e horizontes
emancipatórios. De modo a compreender como a Teia dialoga com esse cenário,
apresento como o debate sobre território e autonomia é reativado nas últimas
décadas, a partir de movimentos socioambientais e agroecológicos protagonizados
por comunidades indígenas, negras e de camponeses, dentro de uma concepção de
renovação das lutas territoriais na América Latina. Como referencial teórico, recorro
às abordagens analíticas que enfocam os aspectos relacionais e multidimensionais
dos movimentos sociais.