No Brasil, os estudos a respeito da política de proibição das drogas frequentemente ganham centralidade no campo das Ciências Sociais por abordarem, entre outros temas, os processos de seletividade e sujeição no sistema de justiça criminal. Entre outras críticas direcionadas à referida política de segurança pública, destaca-se o processo de seleção e prévia tipificação penal na fase da abordagem policial, justificada, muitas vezes, no conceito subjetivo da figura do elemento suspeito e baseadasem estigmas sociais, reproduzindo estereótiposque influenciam nosprocessos de distinção entre traficantese usuáriosde entorpecentes. Alimentadosporelementossociais, econômicos,degênero e,sobretudo,raciais,os estereótipos contribuem para as injustiças sociais e criminalização das classes e grupos sociais vulnerabilizados. Nessa perspectiva, o presente trabalho, cuja ideia surgiu a partir do exercício da prática estagiária na Defensoria Pública do Estado da Bahia, possui como tema principal a abordagem policial e os critérios utilizados pelos agentes para prévia tipificação penal entre traficanteseusuáriosde drogas. Nessesentido, objetivou-se analisaros processos de tomada de decisão dos policiais do município de Porto Seguro, no momento da abordagem, entre os delitos tipificados nos artigos 28,caput, e 33,caput, ambos da Lei nº 11.343/2006. Através da revisão bibliográfica e da análise documental, a pesquisa utilizou-se do estudo de caso para analisar os autosde prisão em flagrante delito e ostermos circunstanciados de ocorrência, lavrados entre os anos de 2020 a 2022, com a finalidade  de mapear as atuações policiais no município, construindo um perfil socioeconômico dos sujeitos tipificados como usuários e traficantes de drogas e, a partir dos critérios utilizados para tipificação penal, inferir se existe uma seletividade policial com base em critérios inerentes às pessoas. Como resultados, destaca-se a pequena quantidade de pessoas não-brancas registradas, contribuindo para a interpretação de que a cor da pele pode ser um critério para seleção dos agentes abordados. Ademais, a idade e o gênero foram outros critérios subjetivos que predominaram nos registros policiais. Entre os critérios objetivos destacados, foi possível perceber a maior tendência à tipificação pelo tráfico de drogas em casos onde as pessoas presas em flagrante portavam grandes quantidades e variedade de substâncias ilícitas, ainda mais se acompanhado da apreensão de aparelhos celulares, máquinas de cartão, arma de fogo, entre outros. Portanto, é possível presumir que os critérios que levam a ocorrência de umaabordagempolicialsãoinerentesaossujeitos,sendooselementosobjetivos responsáveis, em grande medida, na distinção entre traficantes e usuários no município.

O presente estudo aborda sobre a influência dos movimentos migratórios na gastronomia da Ilha de Moçambique, explorando as transformações socioculturais promovidos pelas trocas e dinâmicas culturais entre os povos locais e dos imigrantes. Reza a história que a Ilha de Moçambique foi anteriormente habitada por vários grupos étnicos provenientes de diferentes pontos do mundo o que impactou nos seus hábitos culturais, dos quais as práticas alimentares. A partir do registo etnográfico das memórias e histórias de vida relacionadas à alimentação das famílias da Ilha de Moçambique, foram identificadas mudanças ocorridas ao longo do tempo. Para efeito foram utilizadas as técnicas de observação participante, diário de campo, registo fotográfico, entrevistas colectivas e histórias de vida das famílias abrangidas pela pesquisa. Como resultado desta pesquisa, o estudo aponta existência de vários aspectos alterados em alguns pratos na Ilha de Moçambique. Como também foi notória a resistência em manutenção de alguns hábitos alimentares e os modos de confecção. O uso de temperos em alguns pratos que não era o habitual em tempos foi um dos aspectos verificado no campo de estudo, assim como o uso de caldo para melhorar o paladar da comida. O caldo foi vincado como um produto que faz mal a saúde dos consumidores pelo que alguns dos interlocutores criticaram o seu uso e questionaram sobre as políticas de consumo que não vedam a venda deste produto. Fora as transformações socioculturais verificadas nos modos de preparo em alguns pratos, o estudo apontou a imbricação cultural de alguns pratos com os hábitos culturais das comunidades da Ilha de Moçambique, pois referiu-se ao longo das conversas tidas com alguns dos interlocutores que existem pratos obrigatórios nas cerimónias tradicionais (evocação dos ancestrais). Estas ligações entre a alimentação e os povos mostram o quão a sociabilidade moderna tem enfrentados resistências culturais nas comunidades locais. A modernidade foi também observável na Feira e no Festival macute que realizam-se na Ilha, onde notam-se muitos aspectos modernos inerentes a alimentação. Estes elementos da modernidade vêm responder as questões levantadas pelos interlocutores sobre a carências de alguns itens que fazem parte da gastronomia local, o que obriga a esta comunidade a optar por consumir produtos manufacturados patentes em diversas mercearias na Ilha de Moçambique e não só. Do Museu buscaram-se informações sobre os instrumentos usados na cozinha durante longos anos na Ilha de Moçambique, assim como a sua evolução ao longo do tempo. Foi com base nessas informações que se percebeu o valor que as panelas de barro têm na conservação dos alimentos. O estudo apresenta as discussões das visões dos seus interlocutores confrontando com as bases teóricas consultadas ao longo da revisão da bibliográfica. Finda o estudo apresentando alguns pratos típicos do local de pesquisa na análise e discussão dos resultados, onde são indicados os dados sobre as mudanças de certos pratos que culturalmente resistem da modernidade alimentar que se verifica no mundo em geral. Conclui apresentando as considerações finais que ditaram o surgimento de novos hábitos alimentares na Ilha de Moçambique como consequência dos movimentos migratórios que esta região sofreu, nascendo assim a chamada gastronomia da Ilha de Moçambique. Foram apresentadas as perspectivas futuras das pesquisas.  

A uberização do trabalho vem suscitando debates acerca dos limites entre o trabalho autônomo e aquele caracterizado como relação de emprego. À medida em que estas fronteiras são borradas, revela-se uma nova estratégia empresarial de ocultação da relação de emprego e precarização de direitos. O objeto desta pesquisa é a uberização, neologismo que advém da empresa Uber e se tornou sinônimo do trabalho realizado através de aplicativos digitais disponíveis em aparelhos celulares. Enquanto as empresas encaram isto como um trabalho autônomo e excludente da aplicação de leis trabalhistas, não há ainda uma posição consolidada sobre o tema nos tribunais. Esta tese investiga se a prestação de serviços de motoristas da Uber configura um dos requisitos da relação de emprego, a subordinação. A partir de uma perspectiva multidisciplinar, que conjuga o direito, a sociologia e a antropologia, o objetivo dessa tese é fazer surgir os elementos que constituem esta fronteira entre o formal e o informal. As reflexões aqui apresentadas resultam da aplicação de diferentes métodos de pesquisa, como a revisão bibliográfica, o levantamento de decisões judiciais e textos legais, além de uma abordagem empírica orientada pela etnografia que inclui a análise da plataforma Uber, redes sociais e um trabalho de campo dirigindo como motorista da Uber entre dezembro de 2021 e março de 2022 na região metropolitana de Salvador/BA. A tese demonstra como as técnicas da Uber, típicas do capitalismo de vigilância, fazem uso sistemático da subordinação e permitem o enquadramento do trabalho realizado por motoristas de aplicativo como relação de emprego.

A participação social voltou [2023] a ser pauta no processo de gestão de políticas públicas. Acerca disso, fervilham debates sobre a melhor arquitetura para inserir a população no planejamento, implementação e controle social dessas políticas. As experiências passadas estão sendo revistas para melhorar o desenho de novos percursos. Neste contexto, esta pesquisa analisou a participação social no Conselho de Desenvolvimento Territorial (CODETER) do Território de Identidade do Extremo Sul da Bahia (TIES), a fim de entender como os atores se organizam, se reconhecem e se envolvem em questões de seu interesse, para gestão das políticas públicas. A consolidação da participação no CODETER confirma-se na consecução e continuidade de ações no território e ocorre por meio do reconhecimento dos diversos atores desse instrumento como mediador de seus interesses na arquitetura da participação social na abordagem territorial. O estudo justifica-se como relevante porque o modelo de Políticas Públicas de Desenvolvimento Territorial (PPDT) implantado no Brasil em 2003 foi prefigurado na perspectiva de gestão participativa. Por isso, pesquisou-se a participação nesta política, a fim de entender como se realizou esse processo e como as relações se desenvolveram. Tratase de um trabalho realizado por meio de métodos e técnicas de natureza qualitativa e quantitativa, o qual demandou levantamento de dados secundários, pesquisa documental e de campo, pelo acompanhamento de ações do Codeter, entrevistas semiestruturadas e aplicação de questionários. As teorias orientadoras do olhar para o problema levantado foram a “Mirada ao Revés”, de Rosana Boullosa, que permitiu localizar os atores e os identificarem no problema adjacente das dificuldades de participação e a “Teoria dos Incentivos Mútuos”, que orientou a localização dos elos da participação social no território. Como resultado, identificou-se que o modelo de gestão territorial aplicado à realidade do TIES-BA possui elos condutores de fortalecimento da participação no desenvolvimento territorial, ligados por forças originadas da identidade e da história política, demográfica, econômica e social do território, assim como foram identificadas fragilidades que estão ligadas à gestão da política que não contempla o Codeter com recursos previstos para sua manutenção, que compromete o reconhecimento do seu papel no processo. Espera-se que este trabalho seja orientador de outras pesquisas no território, diante das situações levantadas que requerem mais estudos para contribuir com os processos de políticas públicas de desenvolvimento territorial, de modo que sejam pensadas estratégias que atendam às demandas e bem-estar dos diversos atores.

A economia solidária é composta por atividades econômicas coletivas em que os trabalhadores se associam e praticam a autogestão de seus empreendimentos e negócios. As mulheres têm se destacado na economia solidária, tornando-se sujeitos políticos, participativos e empoderados, e ressignificando seus papéis na superação da exclusão e invisibilidade social. Esse estudo, de natureza exploratória e descritiva, teve como objetivo analisar como e de que forma as práticas de economia solidária podem contribuir nos processos de ressignificação dos papéis sociais, empoderamento e de construção de novos laços produtivos, reprodutivos, sociais e econômicos das mulheres trabalhadoras da COOMAFES. Para isso, foi realizado um estudo na Cooperativa de Mulheres da Agricultura Familiar e Economia Solidária - COOMAFES, no município de Valença-Ba, que tem se apresentado como importante instrumento e espaço coletivo de trabalho, reconhecimento e luta por melhoria de condições socioeconômicas, socioprodutivas e de construção de relações das mulheres na região Baixo Sul. A metodologia utilizada foi de natureza qualitativa e, por meio do estudo de caso na COOMAFES, foram analisadas as histórias de vida das mulheres pesquisadas. Os resultados do estudo indicaram que a economia solidária para as mulheres da cooperativa estudada foi e é capaz de promover processos de autonomia, emancipação e empoderamento, bem como foi capaz de ressignificar papéis sociais e identitários, favorecendo mudanças nas trajetórias de vidas das mulheres, contribuindo para a construção de novos laços produtivos, reprodutivos, econômicos e sociais, baseados nos princípios da economia solidária e nas vivências no coletivo solidário. As principais conclusões do estudo apontam para o entendimento de que a economia solidária é sim, instrumento que pode promover mudanças nas histórias e nas trajetórias de vida de quem desenvolve atividades produtivas ligadas a ela, e, especificamente neste estudo, transformou as histórias de vidas das mulheres da COOMAFES e que dessa forma, pode servir de modelo para outros grupos da economia solidária, sejam mistos ou de mulheres, a partir de como elas se organizam, de como as experiências de cada mulher é valorizada, da importância que a cooperativa dá às formações dos membros do coletivo em termos de comercialização, organização de atividades produtivas, controle econômico-financeiro, bem como o incentivo a participação nos espaços, na busca por reconhecimento, autonomia, emancipação, através da ajuda mútua, valorizando as histórias individuais e a cultura das comunidades, fortalecendo laços sociais e identitários e buscando acessar a políticas públicas que possam fortalecer as pessoas através da geração de trabalho e renda, bem como desenvolver os empreendimentos econômicos solidários do território.

analisar a judicialização das relações de trabalho no campo em enfermagem no Brasil, no período de 2014 a 2022. Os objetivos específicos foram: analisar os desdobramentos do modelo de acumulação flexível e a função social do Estado, com ênfase no direito do trabalho e no processo de trabalho em enfermagem; caracterizar o perfil dos processos trabalhistas movidos por trabalhadoras do campo em enfermagem no Brasil no período de 2014 a 2022; analisar as demandas trabalhistas relacionadas à Síndrome de Burnout (SB) movidas por trabalhadoras do campo em enfermagem no Brasil no período de 2014 a 2022. Métodos: utilizou-se uma abordagem quantitativa e descritiva, de natureza documental e jurimétrica. Para embasar a análise, foram utilizados os construtos teóricos provenientes da categoria de "relações de produção" de Marx, assim como as perspectivas teóricas de autores com orientação marxista. O escopo geográfico foi o judiciário trabalhista e o escopo temporal foi retrospectivo, com o recorte a partir de 2014. Para coletar os dados, foi utilizada a técnica de raspagem de dados (webscraping) e o software Data Lawyer Insights. Resultados: Foram identificados 200.127 processos, totalizando R$ 13,96 bilhões de reais em valor das causas, com valor médio de R$ 70.245 reais. Em relação às fases processuais, existem 75.326 processos em fase de Conhecimento, 32.136 em fase de Liquidação e 11.493 em fase de Execução. Os Estados do Rio de Janeiro, Bahia e Minas Gerais apresentaram o maior número de ações trabalhistas. Entre 2014 e 2017, observou-se uma tendência de crescimento na distribuição dos processos trabalhistas, passando de 11.025 para 31.672 casos. A partir de 2018, verificou-se um declínio no volume de reclamações. A duração média do processo foi de 618 dias. No período de 2014 a 2017, houve um crescimento no volume de acordos e um aumento de revelias, enquanto a partir de 2018 esses números reduziram. Identificaram-se 407 processos que mencionaram a Síndrome de Burnout nos pedidos apresentados na petição inicial. No ranking de cumulação de pedidos relacionados à SB, a doença ocupacional foi a mais mencionada nos processos, seguida pela rescisão, adicional de horas e assédio moral. Verificou-se uma concentração de ações nos estados de São Paulo e Rio Grande do Sul, que somaram juntos 107 processos (46,7%). Os dados desta pesquisa indicam que a maioria dos pedidos foi julgado parcialmente procedente e resolvida na Primeira Instância. Conclusão: As mudanças na legislação trabalhista foram implementadas com o intuito de legitimar práticas empresariais anteriormente consideradas ilegais, alinhadas ao neoliberalismo. No entanto, decisões judiciais embasadas nos princípios constitucionais têm o potencial de reafirmar os direitos fundamentais e contribuir para a efetivação dos direitos laborais. Apesar do baixo número de pedidos relacionados à SB na Justiça do Trabalho, pesquisas indicam uma alta prevalência dessa síndrome entre as categorias do campo da enfermagem. Indica-se a necessidade de uma abordagem interdisciplinar para encontrar soluções que possam atenuar os prejuízos sofridos pelas trabalhadoras, indo além do ambiente de trabalho, uma vez que esses problemas também afetam o ambiente social em que elas estão inseridas como cidadãs.

Compreender a ação governamental que impulsionou a criação do Programa Minha Casa, Minha Vida (PMCMV), em 2009, e estabeleceu a sua macroestrutura, base para a sua execução e da qual partiram as alterações nele realizadas até que fosse descontinuado, em 2020, é o objetivo geral da presente tese, com especial recorte para a Faixa 1 do Programa, destinada ao estrato populacional de mais baixa renda, e para a modalidade que utiliza recursos do Fundo de Arrendamento Residencial (FAR). Para alcançá-lo, foi acionado um instrumental analítico fundamentado, principalmente, nos trabalhos de Maria Paula Dallari Bucci, cuja abordagem teóricometodológica permite a identificação e sistematização das condições, regras e instituições jurídicas necessárias à implementação das políticas públicas. Respaldado por este referencial, propõe-se uma leitura das dimensões jurídico-institucionais do PMCMV em duas etapas, que correspondem aos objetivos específicos da pesquisa: 1) a partir de um plano macroinstitucional, cuja reflexão gira em torno do contexto e das disputas políticas no ambiente do governo que desafiaram a sua concepção, a fim de evidenciar a decisão por ele tomada; 2) e a partir de um plano microinstitucional, em que se analisa a tradução normativa dessa mesma decisão e a regulamentação dos processos que organizam a ação governamental e conduzem aos resultados por ele alcançados, sobretudo quanto à produção do espaço urbano para a Faixa 1, onde se concentra o déficit habitacional e cujos empreendimentos localizam-se em regiões periféricas. Para o estudo da esfera macroinstitucional, recorre-se a uma revisão interdisciplinar de literatura, sustentada em autores/as que tratam das políticas habitacionais no Brasil e, mais especificamente, do PMCMV; no plano da microinstitucionalidade, são analisadas a Lei nº 11.977/2009 e as portarias produzidas pelo Ministério das Cidades e pelo Ministério do Desenvolvimento Regional entre 2009 e 2020, relacionadas às categorias eleitas para o desenvolvimento do tópico: escala e público-alvo; alocação de recursos; e o papel dos agentes governamentais e nãogovernamentais. Ao criticar as formas jurídico-institucionais do PMCMV, o estudo considera o conceito de direito à cidade empreendido por Henri Lefebvre como horizonte epistemológico do fenômeno urbano, bem como as tentativas de apropriação dele pelo ordenamento jurídico brasileiro, notadamente pelo Estatuto da Cidade (Lei nº 10.251/2001), sua base principiológica e os instrumentos urbanísticos por ele estabelecidos, e pelo capítulo constitucional reservado à política urbana. Isto porque defende-se que tais pressupostos deveriam ser centrais numa política pública que anunciou o déficit habitacional quantitativo como o problema social que pretendia atacar e o direito à moradia e ao planejamento urbano enquanto garantias a serem efetivadas a partir de sua implementação. Por fim, tendo em vista os critérios de seleção dos/as sujeitas/as dos direitos veiculados pelo Programa e os dados históricos sobre a desigualdade urbana de raça e de gênero, aposta-se numa discussão sobre a interseccionalidade, para que se pensem novos pressupostos para o fazer institucional de políticas que lidam com a segregação socioespacial, como é o caso do PMCMV.

Este trabalho tem como situação impulsionadora a execução de um projeto que atuei como antropóloga, que envolvia diversos atores, com foco, objetivando capacitar os primeiros, a atuarem de forma adequada com as populações indígena, ao mesmo tempo garantindo os direitos humanos e a atenção diferenciada. No entanto, os atores envolvidos frequentemente oscilaram entre perspectivas conflitantes. Essa dualidade foi muitas vezes percebida como antagônica, destacando-se um ponto de análise fundamental: o embate entre o relativismo cultural, interpretado como particularismo, e os Direitos Humanos, entendidos como universalismo. Dessa forma buscou-se entender as formas e os meios de interação entre o povo Pataxó e o Estado e qual o potencial de mudança social e cultural desta relação, visto o encontro e choques de temas, modelos de conduta, lógicas que são reflexos de diferentes visões de mundo. Um esquema de execução da pesquisa foi iniciar historicizando esta relação e suas diferentes naturezas e impactos nas diferentes fases da história, passando a focar neste tipo de interação dos Pataxó com as instituições estatais na contemporaneidade, afunilando para o caso do citado projeto, mostrando como os Pataxó reivindicaram o acesso a direitos, identificando políticas públicas como uma possível ferramenta mitigadora da vulnerabilidade social que os afetam, e, mostrando também como pautaram o desenho do projeto para o incremento da atenção diferenciada em fase de implementação da política socioassistencial a nível municipal. Neste sentido há uma parte descritiva deste momento, no qual foram debatidos entre os participantes estratégias para enfrentar problemas persistentes identificados entre e pelo os Pataxó, que são característicos de uma situação de vulnerabilidade social, como a violência contra mulher, trabalho infantil, e uso e abuso de drogas. No segundo momento da pesquisa, buscamos saber sobre os desdobramentos dos esforços empenhados no projeto, com a execução do redesenho, assim como possíveis mudanças no intervalo de tempo entre as pesquisas de campo, em relação aos temas centrais do projeto. Em um ciclo de retroalimentação, além de pesquisa bibliográfica, foram empregados elementos para ilustrar determinados temas, como conteúdos provenientes do jornalismo e das mídias sociais. O conjunto de materiais analíticos compreende as experiências de campo durante os anos de 2015-2016, acrescida de pesquisa de campo realizada entre 2019 e 2023, na qual foi disposta entrevistas estruturadas e semi-estruturadas, e acompanhamento de caráter etnográfico de algumas situações e de forma multissituada. Quanto a presença ou não do Estado em contextos territoriais indígenas, podemos de certa forma afirmar que, apesar de indesejado (e as vezes circunstancialmente dependendo dos governantes no comando) em alguns casos ou por algumas vertentes destas sociedades, o Estado é presente nestas situações. A estrutura estatal, percebida como inevitável, passa a ser instrumentalizada pelos Pataxó, para reivindicar meios de mitigar ações do Estado desvantajosas para os povos indígenas e que os colocaram em uma situação de vulnerabilidade social na atualidade. Entende-se aqui que o Estado pode garantir direito da mesma forma que pode ser violador de direitos. Foi percebido uma postura de protagonismo dos Pataxó, no desejo e luta para ocupar espaços públicos e instancias próprias do Estado entendendo como forma de garantia de direitos e políticas públicas. Quanto a possíveis mudanças culturais, à luz da antropologia e aos estudos de etnologia indígena no Brasil, podemos afirmar uma cultura como um sistema aberto e dinâmico pode ser modificada por interferências externas ou inquietações internas.

O bullying no contexto escolar materializa-se como a violência repetida, caracterizada nas agressões propositais de cunho físico, psicológico contra alguém com dificuldade de se defender, culminando numa relação de controle e opressão sobre a vítima. O objetivo desse estudo foi caracterizar o fenômeno do bullying, buscando investigar as suas relações com fatores pessoais (sociodemográficos e psicológicos) e contextuais (familiar, grupo de pares, escola e comunidade) em estudantes dos cursos integrados do Instituto Federal de Ciência e Tecnologia da Bahia- IFBA, campus Eunápolis. Trata-se de um estudo quantitativo, descritivo, do tipo relacional, ex post facto, de corte transversal. A amostra foi composta de 194 estudantes e os instrumentos usados foram a escala de vitimização do bullying, a escala de comportamento do bullying, a escala de autoestima de Rosenberg, a escala multidimensional de satisfação de vida, a escala de responsividade e exigência parental, o dimensions of discipline inventory (DDI), a negative peer influences scale, o neighborhood safety scale e a escala de percepção do ambiente escolar, além de um questionário sociodemográfico. Para a análise dos dados foi empregada a estatística descritiva e a inferencial, todas efetuadas no IBM/SPSS Statistics 25 e o nível de significância adotada foi de 0,05. Os resultados apontaram que a prevalência para todas as formas de vitimização foi superior a 34%, com destaque para o bullying do tipo verbal, que foi de 63,4%. Já a prevalência de comportamento agressor apareceu mais baixa do que a de vitimização, com exceção da agressão do tipo verbal que foi de 52,1%. O comportamento de praticar bullying independe da idade, mas as vítimas de bullying físico e verbal tendem a ser os sujeitos mais velhos. Há uma maior prevalência de vitimização por bullying verbal entre as meninas e a maior prevalência de meninos envolvidos em situações de agressão por bullying físico. Quanto ao efeito do nível socioeconômico, quanto maior a renda, mais frequente é o comportamento agressor, e estudantes de nível socioeconômico menos favorecidos tendem a ser mais vitimizados. Quanto mais os discentes reportam vitimização (verbal e relacional) e comportamento agressor (do tipo relacional), mais baixos são seus níveis de autoestima e satisfação de vida. No que diz respeito ao efeito das práticas parentais, de modo geral, uma combinação entre disciplina com muita exigência, pouca responsividade, com retirada de privilégios e exigência de compensação frente ao mau comportamento do filho/filha e uso de violência psicológica, física e agressão verbal parece ser nociva ao desenvolvimento emocional, pois se associa à vitimização por bullying, em seus mais variados tipos, e também ao comportamento agressor, especialmente, ao bullying físico, relacional e verbal. No que diz respeito à percepção de comportamentos negativos dos pares, o grupo de vítimas/agressoras reportam ter mais amigos delinquentes e bullies. Além disso, discentes que pertencem ao grupo de vítimas/agressoras são aqueles que percebem suas comunidades como mais violentas, seja essa uma violência difusa, afastada de sua vida, ou próxima. Finalmente, os vitimizados se sentem mais inseguros e desamparados no ambiente escolar, percebem pouca aceitação e segurança por parte de seus pares, percebem que seus pais são pouco envolvidos na sua vida escolar e sentem que sua escola é injusta e desrespeitosa em relação a eles. Os praticantes de bullying físico e de bullying relacional, por sua vez, também percebem a escola como menos justa e menos respeitosa se comparados aos seus pares que não praticam bullying. Finalmente, praticantes de bullying físico também percebem um menor envolvimento dos pais com suas atividades escolares. Espera-se que essa pesquisa possa contribuir para o desenvolvimento de ações preventivas de combate ao bullying dentro da instituição estudada.

A Terra Indígena de Coroa Vermelha é palco de uma intrincada sobreposição de competências institucionais, com múltiplas regulamentações protetivas, no entanto, a profusão de competências comuns contrasta com a instalação de um quadro de ocupação urbana desordenada e de omissão generalizada. Na problematização do tema deste estudo indagou-se precipuamente: quais são as competências institucionais incidentes sobre o território de Coroa Vermelha? Como funciona o sistema de competências materiais comuns neste território? Se, sob o prisma teórico, o instituto jurídico do Consócio Público poderia ser alçado à ferramenta de diálogo e de efetivação de políticas públicas com o fim de mitigar as condutas omissivas supostamente decorrentes da fragmentação de responsabilidades em Coroa Vermelha, em especial relacionadas à questões ambientais e urbanísticas. A partir de um problema afeto ao Direito Público, este ensaio jurídico partiu da contextualização da ocupação humana do território analisado, abordando-se por meio de levantamento bibliográfico e documental, principalmente, a historicidade da sua evolução demográfica. Em sequência, promoveu-se o levantamento cartográfico, com enfoque nas demarcações administrativas, elaborando-se o mapeamento a partir do Sistema de Referência Geocêntrico para as Américas (Datum SIRGAS 2000), consubstanciado por outras elaborações cartográficas encontradas no levantamento bibliográfico e documental, além da constatação fotográfica, pelo próprio autor, in loco, da existência de uma ocupação desordenada que constitui a realidade de fundo do problema. A partir destes processos, das premissas com eles estabelecidas e com o manejo de novos levantamentos bibliográficos e legislativos, expôs-se os regimes jurídicos aos quais o território está submetido, bem como, discutiu-se a competência comum como configuração jurídico-política voltada à proteção ambiental e urbanística, com enfoque na constatação de uma relação entre a sobreposição de competências e a omissão estatal, para, por fim, distinguir e sistematizar soluções para a gestão de áreas com conflitos de competência, a exemplo da gestão consorciada combinada com participação social, em áreas com impasses similares. A preponderância do estudo bibliográfico como instrumento metodológico não dispensou a coleta de dados de comprovação e de materialização da realidade estudada e isso promoveu uma visão crítica ponderada pela realidade verificada in loco. Os dados e os conteúdos coletados foram preparados e submetidos à uma descrição analítica do conteúdo por meio de uma interpretação indutiva, focada nas características da mensagem, no seu valor informacional, e nas palavras, argumentos e ideias expressas, visando contextualizar qualitativamente documentos, fotografias e mapas cartográficos com a legislação e a normatização aplicável, com os conceitos acadêmicos envolvidos e com as informações teóricas trazidas pela bibliografia, ao ponto de viabilizar a exposição das conclusões a partir da apresentação de um resumo das análises centrais, explicitando, inclusive, as alternativas ao quadro que ensejou a pesquisa. Assim, a solução dos conflitos de competência existentes entre os órgãos públicos envolvidos (FUNAI, IBAMA, IPHAN, SPU, INEMA, DNIT, Marinha, órgãos municipais), a demonstração da não efetividade de múltiplas proteções legais sobre um mesmo território e, ao mesmo tempo, a apresentação de uma alternativa juridicamente viável como a gestão consorciada do território analisado e de outros em circunstâncias similares, correspondem aos resultados alcançados.

O presente trabalho explora a interconexão conceitual dos termos pluralismo de Isaiah Berlin e pluralidade em Hannah Arendt, as suas distinções, seus encontros e as suas divergências.  Também se ocupa das possíveis raízes desses conceitos em uma sociedade moderna tardia, da importância de colocá-los assertivamente no percorrer da tradição filosófica e do pensamento político ocidental. Ademais, se aproxima das dificuldades na compreensão das definições desses conceitos assim como dos seus efeitos para noções e metodologias da teoria política, a história e até a filosofia. Esse trabalho também indaga em os atingires do pluralismo e a pluralidade em relação com problemas atuais como são a ação concertada, o reconhecimento da diferença, a discussão política nas sociedades multiculturais, e a possibilidade de através da sua análise encontrar luzes para a compreensão das necessidades que subjazem a uma cidadania global. Para terminar, por meio dessa análise conceitual, se procura desvelar as faculdades humanas próprias para o exercício político da liberdade e o talante estético delas. 

Frente à crise contemporânea do Direito pela incapacidade de acompanhar as transformações sociais e necessidades de seus sujeitos, no reconhecimento e proteção dos direitos das classes subalternizadas, especialmente, dos camponeses e das camponesas juntamente das práticas comunitárias como expressões multiculturais de representação de juridicidade, este estudo se apresenta enquanto instrumento de reflexão sobre as práticas territorializadas entre os camponeses das comunidades rurais de Vale Verde - Bahia, Brasil. O objetivo desta pesquisa é identificar a emergência de elementos da produção de juridicidade no território bem como a existência de um pluralismo jurídico nas comunidades rurais de Vale Verde. Trata-se de um estudo qualitativo que parte de uma revisão de literatura sobre a temática para, então, uma posterior imersão na prática empírica através da etnografia, configurando-se, portanto, como trabalho no campo da antropologia jurídica. Apresenta como unidade de análise as comunidades rurais e diante das hipóteses iniciais, a investigação aponta que a comunidade estudada evidencia elementos da produção de juridicidades alternativas diante da privação do acesso a direitos e ineficiência do poder público local na promoção substancial de políticas públicas para os camponeses. Os elementos encontrados em campo indicam a existência de uma lógica próxima ao pluralismo jurídico comunitário, porém, o conjunto de evidências necessárias para inferir a que o modelo se aplica concretamente na prática não se apresentou em sua totalidade, evidenciando o baixo grau de participação social devido a desarticulação da associação dos produtores rurais.

Esta dissertação apresenta uma proposta de pesquisa interdisciplinar de ensino e aprendizagem de língua inglesa para adolescentes em conflito com a lei como atividade extraescolar ressocializante. Ela surgiu da observação prática da autora em relação à falta de atividades ressocializantes para adolescentes em conflito com a lei que levassem em conta todas as peculiaridades e desafios das suas condições socioculturais. A pesquisa baseia-se nas teorias da Linguística Aplicada, campo de estudo transdisciplinar e intercultural que identifica e usa soluções para problemas relacionados à linguagem na vida real. Sob o ponto de vista de que não se pode separar linguagem e vida social, dada sua complexidade, a LA estabelece diálogos com outras áreas de estudos nesse projeto como: Educação, Filosofia, Psicologia, Direito e Serviço Social. Teve como objetivo geral: Analisar possibilidades ressocializantes do ensino da língua inglesa como atividade extraescolar para adolescentes em cumprimento de MSE (Medida Socioeducativa) através da metodologias ativas e de forma descolonizada e como objetivos específicos: Promover minicurso de língua inglesa para adolescentes em cumprimento de MSE no CREAS de Teixeira de Freitas para avaliar as potencialidades do inglês como atividade ressocializante; investigar, por meio de metodologias ativas, os processos de ensino de inglês para adolescentes em conflito com a lei; compreender qual a relação que os adolescentes em cumprimento de MSE fazem entre o mundo, a língua inglesa, a sociedade e eles mesmos. A metodologia utilizada foi a pesquisaação. Ao final concluiu-se que os processos de ensino e aprendizagem de língua inglesa para adolescentes em conflito com a lei através de metodologias ativas do ponto de vista didático e cognitivo é similar ao desenvolvido em qualquer outro público, todavia havendo um processo diferenciado do ponto de vista da reconstrução da autoestima e autoeficácia para esse público. No que diz respeito à relação que eles fazem entre eles mesmos, a sociedade e a língua inglesa, verificou-se a hipótese levantada, pois visões do senso comum como: “não sei nem português, quanto mais inglês” ou “nunca vou viajar para fora”, foram levantadas, mas ao final do processo de aprendizagem através de um ensino multicultural e descolonizado os adolescentes demostraram uma visão mais holística do idioma. Por fim, a hipótese levantada da possibilidade de inserção da língua inglesa como atividade ressocializante no CREAS mostrou-se possível, de acordo com os dados coletados dos profissionais da instituição e do próprio minicurso aplicado.

O aumento da ocorrência de casos de violência e conflito com a lei, protagonizados por menores de dezoito anos, vai delineando um campo infinito de problematizações para as ciências humanas e sociais. As medidas socioeducativas surgem como tentativa de enfrentamento por parte do Estado ao cenário de violência e ato infracional cometido. Tais medidas surgem de movimentos de lutas por direitos humanos e das crianças e adolescentes desde o século passado e, no presente momento, configuram-se a partir da Doutrina de Proteção Integral, como afirma o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo. Essa Doutrina representou um importante avanço em relação à Doutrina da Situação irregular vigente, marcada pelo controle da infância e da juventude, caráter repressivo da legislação e pela criminalização da pobreza. As medidas socioeducativas são determinadas judicialmente para adolescentes em conflito com a lei e trazem consigo metas audaciosas como ressocialização do adolescente e o fortalecimento de vínculos comunitários e familiares, mas se apresentam, em distintas pesquisas, marcadas por crenças relacionadas a sua não efetivação. Estudos que focalizaram na percepção, crenças ou representações sociais dos próprios adolescentes sobre as medidas socioeducativas ainda são escassos na literatura nacional e internacional. Ademais não foram encontradas, na literatura, nenhuma investigação comparativa de representações sociais sobre a efetividade das medidas socioeducativas elaboradas por sujeitos que a receberam e familiares. Frente ao cenário acima apresentado, a presente pesquisa objetivou caracterizar e comparar as Representações Sociais de egressos de medidas socioeducativas e de familiares de egressos. Para atingir a esse objetivo foram aplicados Teste de Livre Associação de Palavras (TLAP) e realizadas entrevistas semiestruturadas individualizadas com os egressos do serviço (n1 = 07) e de familiares de egressos (n1 = 09). Para análise dos dados advindos do TLAP utilizou do programa EVOC e a técnica de Análise de Conteúdo para os dados coletados nas entrevistas. Como resultados encontrou-se que os núcleos centrais das Representações Sociais dos dois grupos sobre as MSE são semelhantes, ambos constituídos dos termos Educação e Responsabilidade, que reverberaram ao longo da análise de todas as entrevistas individuais que foram realizadas. Quando analisamos e comparamos os núcleos centrais dos grupos sobre Medida Socioeducativa eficaz, vemos o termo Educação se repetir em ambos os grupos e o termo Responsabilidade novamente aparecer no núcleo central dos familiares de egressos e, nos próprios egressos foi possível perceber o ressurgimento do termo no primeiro quadrante da zona periférica. A partir das análises das entrevistas fica evidente como esses núcleos centrais vão produzindo reverberações na apresentação das crenças e percepções sobre a vivência de uma MSE e os impactos pelos sujeitos da pesquisa experimentados. O estudo poderá contribuir para o apontamento de dispositivos que sirvam à reflexão sobre como se lograr êxito frente aos próprios objetivos das medidas socioeducativas, que de acordo com o SINASE (Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo) devem promover a reinserção social, o empoderamento dos egressos e o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários.

O presente trabalho discute as práticas da cultura corporal de movimento, apresentadas nos Jogos Indígenas Pataxó (JIP), especificamente no Território Indígena de Coroa Vermelha - Bahia. Tem como finalidade refletir sobre os processos étnico e identitário, os quais estão atravessados pela perspectiva da cultura e da sua produção de múltiplos significados presentes na prática social. Sendo assim, este estudo buscou demonstrar como os Pataxó constroem seus jogos recriando sua identidade étnica (e vice-versa), bem como descrever como eles elaboram e se apropriam de variadas estratégias que implicam no fortalecimento dos movimentos de resistência para retomada de, entre outras coisas, seus territórios e suas histórias. O estudo foi conduzido em três eixos: no primeiro, são abordadas as questões relacionadas à educação e à escola indígena; em seguida, são analisados os sentidos dos jogos; e, por último, é feita uma reflexão sobre as representações simbólicas do corpo que são rememoradas durante os JIP. O processo metodológico desta pesquisa está pautado na história oral, sendo realizado por meio da coleta de entrevistas e da elaboração de diário de campo. Além disso, este estudo foi desenvolvido tendo como base a pesquisa bibliográfica, ou seja, investigando o material teórico sobre a temática escolhida por meio do reconhecimento do problema delimitador do estudo. Portanto, esta é uma pesquisa qualitativa e descritiva. Como resultados alcançados, podemos caracterizar os JIP como algumas das estratégias elaboradas (dentre várias outras existentes) dentro da escola que contribuem nos movimentos de resistência para as retomadas das terras e das memórias do povo Pataxó. Outrossim, os Jogos também refletem o processo das representações simbólicas do corpo, elucidando as marcas deixadas pelos processos históricos e as dinâmicas territoriais que tiveram como consequências, entre outras, o genocídio, o etnocídio, a perda de território e o esquecimento histórico e social, a que foram submetidos os Pataxó há mais de 500 anos do Brasil. Assim, é possível entender os JIP como uma manifestação sociocultural que marca um novo momento da história Pataxó.

Nesta jornada de investigação, parti da tese de que o Programa de Assistência e Inclusão Social do Estudante (PAISE) é uma política de Estado formulada pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Baiano (IF Baiano), inscrita no Programa Nacional de Assistência Estudantil (PNAES), para a garantia do direito à permanência de estudantes em processo de escolarização. Partindo da antítese de que as descontinuidades governamentais e orçamentárias das políticas de Estado vulnerabilizam o direito à permanência escolar de estudantes e da síntese de que o PAISE, como política de permanência, assegura condições materiais que fortalecem as condições subjetivas de integralização da escolarização como hipóteses sobre o PAISE e a permanência dos(as) estudantes do IF Baiano, foi formulado o seguinte problema: De que formas o PAISE se efetiva para a garantia do direito à permanência aos estudantes do IF Baiano? Como os auxílios que possibilitam moradia, alimentação, translado, material escolar, permanência, creche têm contribuído com a permanência? Com o intuito de alcançar o objetivo geral de analisar a política de Assistência Estudantil no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Baiano (2011-2019), em particular o PAISE, para a garantia do direito à permanência dos(as) estudantes, foi eleito o estudo de caso como estratégia de investigação. Dentre os aspectos metodológicos é interessante destacar a natureza interdisciplinar deste estudo, o meu lugar de fala e de escuta sensível, sou uma pesquisadora participante, uma mulher vinda de família de baixa renda, estudante da rede pública e servidora pública federal. Foi realizado um levantamento bibliográfico e documental, a análise da permanência a partir do PAISE foi desenvolvida por meio da abordagem do materialismo histórico dialético e a pesquisa também envolveu a análise dos documentos oficiais do IF Baiano com as seguintes estratégias de coleta de dados: observação participante, análise dos registros em arquivo e entrevistas com uma amostra de estudantes atendidos(as)/beneficiados(as), com estudantes do movimento estudantil e servidores(as) envolvidos(as) com a Política de Assistência Estudantil do IF Baiano. A presente pesquisa científica está comprometida com a transformação da sociedade, mais especificamente, com a inclusão social dos(as) estudantes em situação de vulnerabilidade social do IF Baiano que contam com a assistência estudantil para permanecer na instituição. Os resultados da pesquisa demonstram que o PAISE apresenta características neoliberais, frágeis, que é fragmentado e sofre com as descontinuidades governamentais e orçamentárias. Entretanto, em meio aos limites, para os(as) estudantes beneficiados(as) as condições materiais promovidas pelos auxílios do PAISE fortalecem as condições subjetivas e contribuem para que os(as) estudantes possam permanecer no processo de escolarização.

O presente trabalho tem como objetivo principal compreender as formas pelas quais a Segunda Guerra Mundial atingiu o Extremo Sul da Bahia. As alterações causadas nas vidas dos moradores da região, devido às dificuldades geradas pelo contexto de beligerância, deixaram marcas profundas em suas memórias. Partimos do princípio de que, embora não tenham ocorrido muitos eventos bélicos na região, tais como batalhas ou bombardeios, os eventos ocorridos no Extremo Sul baiano, entre 1942 e 1945, parecem ter feito os moradores locais viverem um intenso clima de guerra. Isso fez com que as memórias do conflito sobrevivessem ao tempo, mesmo sem que houvesse comemorações cívicas, museus ou monumentos especificamente dedicados à manutenção da memória e da história da guerra na região. As memórias das pessoas estão ligadas a uma série de fatores: os ataques de submarinos do Eixo à barcaça Jacira, em agosto de 1942, e ao navio Afonso Pena, em março de 1942; a circulação de notícias de guerra, através de meios como a telegrafia, o rádio e o jornal; a presença de soldados que guarneceram os principais municípios da região (Belmonte, Porto Seguro e Caravelas); e a convivência conflituosa com estrangeiros. As principais fontes utilizadas ao longo da pesquisa foram jornais e revistas, encontrados, sobretudo, em sítios virtuais, e entrevistas realizadas com moradores da região, a maioria deles com mais de 80 anos. Além disso, foram utilizados dados de recenseamentos da população brasileira e livros de memória, escritos por autores regionais, dentre outras. Apesar da quantidade e diversidade de fontes, existem muitas lacunas, o que impossibilitou a realização de seriações das informações. Para lidar com o material da pesquisa foi utilizado uma abordagem que altera as escalas de observação, partindo do local para o regional e o nacional, tentando contextualizar os eventos e as experiências de guerra. Diante das limitações impostas pelas fontes, parte-se do princípio de que, diante de eventos e situações com múltiplas possibilidades interpretativas, as explicações mais simples são as mais adequadas a este trabalho. Como afirmou o historiador John Keegan, toda história da Segunda Guerra Mundial é, portanto, uma história do mundo entre 1939 e 1945. É nessa perspectiva que este trabalho é apresentado. Ao compreender os eventos da Segunda Guerra Mundial no Extremo Sul da Bahia, além de possibilitar ampliar o conhecimento sobre a extensão deste conflito na Bahia e no Brasil, este trabalho ajuda a resgatar uma parte da história do mundo. 

Este trabalho busca apresentar e discutir o processo de construção da Teia dos Povos, um espaço de articulação de movimentos sociais que surge em 2012, no sul da Bahia, tendo como mote a luta por terra, território e agroecologia. Criando conexões entre diferentes atores sociais, a Teia é atualmente composta por “pescadoras, marisqueiras, ribeirinhos, povo de fundo e fecho de pasto, povos de terreiros, pequenos agricultores, sem-terra, sem-teto, indígenas de muitas nações, quilombolas, povo negro, extrativistas e os muitos elos que apoiam e constroem a eia a partir da solidariedade” (TEIA DOS POVOS, 2019). As relações tecidas nessa rede afirmam a busca da unidade na diversidade como um de seus princípios, ao lado da construção da autonomia que acompanha a luta por território, direcionando os projetos e ações que vêm sendo traçados para as comunidades que participam de sua composição. Esta pesquisa se propõe a analisar essas dinâmicas, discutindo os processos de participação política e construção democrática na perspectiva das redes de movimentos sociais, a partir dos sentidos atribuídos pela Teia dos Povos às relações entre território e autonomia. Além da análise documental do acervo da Teia, a investigação tem como ponto de partida a experiência de construção de um calendário agrícola, possibilitando a aproximação com uma das comunidades da Teia dos Povos, o que permitiu observar na prática como as ações territorializadas desenvolvem-se e conectam-se com os projetos mais gerais dessa rede.

Direcionando o caminho metodológico percorrido na investigação e seguindo os princípios da pesquisa participante, o calendário agrícola carrega a proposta de escutar, sistematizar e materializar os saberes de agricultores que guiam suas atividades de cultivo por métodos tradicionais, integrando-se aos projetos da Teia de valorização e disseminação dos conhecimentos tradicionais dos povos e comunidades que participam de sua rede. Nesse processo, examino como o calendário agrícola porta sentidos específicos de autonomia, ligados à dimensão do cotidiano dos movimentos sociais, em aspectos vinculados às práticas e conhecimentos localizados no dia a dia do trabalho com a terra e da luta pela manutenção no território. Ao enfocar os sentidos da relação entre território e autonomia e os contornos específicos que adquire na Teia dos Povos, é possível ainda observar como essa rede apresenta-se em sintonia com outras articulações de lutas territorializadas latino-americanas, partindo de experiências que afirmam a construção de outros mundos possíveis, com suas práticas e horizontes
emancipatórios. De modo a compreender como a Teia dialoga com esse cenário, apresento como o debate sobre território e autonomia é reativado nas últimas décadas, a partir de movimentos socioambientais e agroecológicos protagonizados por comunidades indígenas, negras e de camponeses, dentro de uma concepção de renovação das lutas territoriais na América Latina. Como referencial teórico, recorro às abordagens analíticas que enfocam os aspectos relacionais e multidimensionais dos movimentos sociais.

O tema desta pesquisa é a formação regional do extremo sul da Bahia, ocorrida entre a segunda metade da década de 1940 e o início dos anos 1970. Neste período verificou-se o início da exploração madeireira sistemática e da expansão da pecuária bovina extensiva por todo o território da nascente região. A atividade madeireira empresarial e a pecuária bovina se constituíram, a partir deste período, nas principais atividades econômicas da região, ultrapassando a tradicional, porém pouco difundida, “economia do cacau”. Contudo, para bem compreendermos as condições socioeconômicas formativas do extremo sul da Bahia, o estudo precisa incorporar as condições ambientais deste processo histórico. A história da formação social do extremo sul da Bahia como região é simultaneamente a história do que sucedeu com sua Mata Atlântica do lugar. O desenvolvimento social e econômico resultou na intensificação sem precedentes da degradação ambiental em toda a região, notadamente o desflorestamento sistemático, fenômeno iniciado por volta de 1950. O objetivo geral desta pesquisa, portanto, é investigar o processo de formação regional do extremo sul da Bahia e suas consequências socioambientais. Em torno deste objetivo, a investigação levantou outros assuntos associados ao desenvolvimento socioeconômico e aos impactos ambientais por este provocado, ocorridos durante o período formativo da região. À medida que a pesquisa avançou temas derivados foram se impondo concretamente: (i) declínio econômico da cacauicultura no extremo sul da Bahia; (ii) desenvolvimento social e econômico relativo (população, produção, circulação, infraestrutura, etc.); (iii) emergência do interior regional (formação de sub-regiões internas); (iv) influência das políticas desenvolvimentistas nacionais; (v) complexidade do meio natural.

O trabalho das mulheres é predominante na produção do beiju de Vale Verde, distrito de Porto Seguro-BA, e constitui-se como principal renda para a maioria das famílias dessas produtoras. Essa tese analisa o trabalho das mulheres, a divisão de trabalho e as relações de gênero no interior da produção do beiju, a qual é organizado a partir da mão de obra familiar. Vale Verde está situado no Extremo Sul da Bahia, região que tem as principais atividades econômicas ligadas à exploração turística, a qual se ancora na história colonial local. O distrito de Vale Verde está inserido nesse contexto, visto que seu passado é ligado a história colonial do Brasil e a ação jesuítica nesse período, além de outros processos históricos que marcam as experiências dos que ali vivem. O local é atravessado pela BA-001; teve diferentes ocupações ao longo de sua história, foi destino de imigrantes e hoje é passagem de viajantes e turistas. Em razão disso, esse distrito apresenta uma dinâmica rural, transformada pela sua proximidade da sede e dos outros distritos, e pelo turismo pujante em todo o município. A dinâmica rural desse distrito fomentou a comercialização de produtos locais artesanais, como o beiju, que atualmente é largamente comercializado nos principais distritos, sobretudo pelo consumo de empreendimentos turísticos. O ponto de partida foi compreender as origens da produção e comercialização do beiju. Por conseguinte, procurou-se ver, na atualidade, as questões de gênero envolvidas no interior do trabalho familiar. Para tanto, utilizou-se da história oral e da observação participante, ocorrida em todas as etapas do trabalho, desde o trato com a mandioca, a fabricação e venda do beiju, para registrar as experiências dessas mulheres, principais interlocutoras dessa pesquisa, nos seus ambientes de trabalho. O estudo levantou informações, através de imagens, relatos e depoimentos, sobre o trabalho de produção do beiju, caracterizando o trabalho de mulheres atuantes na produção e na venda dessa iguaria. O trabalho com o beiju permeia o rural e o urbano, permitindo que as mulheres se movam para além da produção, atuando de maneira ativa na organização e controle do trabalho, mesmo havendo participação masculina nessa produção.

Apresenta-se aqui uma pesquisa sobre o comum, cujo objetivo é refletir sobre as formas de resistência e [re]existência que emergem deste cenário distópico de estreitamento do horizonte democrático a partir da experiência da cidade de Santa Cruz Cabrália, BA. Nesse sentido, busco o princípio do comum nas práticas e relações de produção e de reprodução coletivas, cooperativas e autônomas da Feira Cultural – Encontro na Praça, movimento que pensa o espaço público através do seu potencial gerador de encontros e trocas, promovendo assim novas formas de se conviver e relacionar com a cidade. O marco teórico que informa a pesquisa recai sobre quatro abordagens e perspectivas teórico-conceituais: o comum da produção biopolítica de Michael Hardt e Antonio Negri (2016); o comum da reprodução social de Silvia Federici (2014); o comum da práxis de David Bollier (2016); e o comum como princípio político de Pierre Dardot e Christian Laval (2016). Além disso, foi construído um diálogo com autores nacionais que trabalham com a perspectiva do comum, cujas entrevistas foram reproduzidas no interior do trabalho como formas de fazer-comum e pensar em companhia. A pesquisa é de natureza qualitativa com a realização de entrevistas com participantes que contribuíram com a construção da referida Feira Cultural. Os achados da pesquisa indicam que as experiências de produção do espaço baseadas em relações e práticas de cooperação, convivência e apropriação coletiva do uso do espaço público, convergem para a realização do direito à cidade e nos conduz ao caminho de pensar a cidade como um comum.

Os conselhos de políticas públicas representaram uma das maiores inovações no campo participativo brasileiro após a Constituição Federal de 1988 e tiveram seu maior período de expansão entre 1990 e 2010. Os conselhos, que já vinham recebendo críticas quanto à sua capacidade de intervir nas políticas públicas, passaram a conviver a partir da ruptura democrática ocorrida em 2016, com o desmonte da Política Nacional de Participação Social e seus efeitos nefastos para o exercício do controle social nos demais níveis de governo. Assim, esta pesquisa consistiu em verificar a efetividade deliberativa do Conselho Municipal da Cidade de Porto Seguro (CONCIDADE) em relação às suas finalidades institucionais de debater, formular, deliberar, monitorar e avaliar as políticas de desenvolvimento urbano locais. Para tanto, foram utilizados, em conjunto, o modelo de análise do desenho institucional, preconizado por Cláudia Faria e Uriela Ribeiro, além do modelo da qualidade deliberativa, de Débora Almeida e Eleonora Cunha. Como referências teóricas, as doutrinas de democracia deliberativa e de esfera pública, defendidas por Jürgen  Habermas, bem como as adequações da esfera pública ao contexto brasileiro propostas por Leonardo Avritzer e Sérgio Costa. Para alcançar os objetivos, foram realizadas:  análise documental das normas de criação e organização do conselho; a sistematização das atas de reunião do período de 2019 até 2020; a aplicação de entrevistas semiestruturadas e de um formulário com questões fechadas (em sua maioria), aos/às conselheiros/as do CONCIDADE em 2020. Como resultado desse levantamento de dados primários, a abordagem da análise do desenho institucional revelou graus médios de democratização e de institucionalização e um baixo grau de representação no conselho. Já a abordagem da qualidade do processo deliberativo apontou baixo grau de efetividade deliberativa,  o que indica que o conselho possui reduzida capacidade de influenciar, controlar e decidir sobre a politica de desenvolvimento urbano de Porto  Seguro. O modelo da qualidade do processo deliberativo demonstrou, ainda, que a teoria democrática deliberativa oferece sólidos elementos para a análise dos conselhos como a utilização dos princípios da publicidade, da pluralidade e da igualdade deliberativa. Entretanto, os resultados apresentados apontam que o CONCIDADE distancia-se, até mesmo, da esfera pública nos moldes habermasianos, porquanto não revela a presença, de modo satisfatório, dos elementos necessários ao exercício do livre debate.

O Matriciamento ou Apoio Matricial constitui-se em um equipamento utilizado em Saúde Pública, que ocorre por meio de processo dialógico entre profissionais e participantes da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), de cunho transdisciplinar, intersetorial e em rede, tendo como locus o território. Tal equipamento fundamenta-se em documentos do Ministério da Saúde, apresentando-se como uma forma de cuidado substitutivo dos hospitais psiquiátricos, tendo produzido impacto reconfigurativo nas relações interprofissionais, ao priorizar a corresponsabilidade do cuidado, nos diversos níveis de atenção. O interesse em estudar o Matriciamento entre Saúde Mental (SM) na Atenção Básica (AB) e como os profissionais de saúde avaliam sua prática originou-se da experiência com o Projeto Percursos Formativos da RAPS/ Projeto Engrenagens da Educação Permanente, realizados no período de 2013 – 2016 no município de Eunápolis, na Linha de cuidado “Saúde Mental na Atenção Básica”, dentre os quais um dos objetivos relevantes era a implantação do Matriciamento nos territórios. Este trabalho teve por objetivo analisar os alcances e desafios encontrados na prática profissional no processo de Matriciamento entre SM e AB, no contexto do trabalho em rede no município de Eunápolis. Tratou-se de uma pesquisa de campo, qualitativa, do tipo estudo de caso, cujos dados foram coletados em duas etapas: na primeira, realizou-se pesquisa teórica e documental sobre a RAPS e o fenômeno do Matriciamento e, na segunda, foi conduzida uma pesquisa de campo, com uso de questionário sociodemográfico para caracterização dos participantes e de entrevista semiestruturada, cujos resultados foram analisados por meio da Análise de Conteúdo de Bardin. Os resultados apontaram a existência de desafios, mais referidos que alcances, em vista da precariedade ou mesmo da não ocorrência do Matriciamento. Tais desafios revelaram dificuldades para a implementação e manutenção do Apoio Matricial entre SM e AB, incluindo fatores que vão desde aspectos relativos a subjetividades até a insuficiências na formação profissional. Também foram observadas, a partir das entrevistas, problemas relacionados a questões de infraestrutura e de gestão, dentre outros. Quanto aos alcances percebidos, quando da ocorrência do Matriciamento, apontou-se para o aumento da resolutividade em saúde, a quebra de preconceitos com pessoas com transtornos mentais e a melhoria da comunicação e do acesso em saúde, por exemplo. Conclui-se, a partir desta pesquisa, que existe a necessidade de investimento em Educação Permanente para o trabalho em rede e aprimoramento dos profissionais da RAPS local, no sentido de capacitá-los para implantar e manter as ações matriciais. Espera-se que este estudo, ao problematizar o Apoio Matricial, possa promover a ampliação de reflexões acerca da formação profissional no aspecto das ações coletivas e da importância em promover práticas democráticas em saúde, conforme preconizado pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Finalmente, infere-se que este trabalho traga a possibilidade de contribuir para melhorias na efetividade em Saúde Mental no território estudado.

O trabalho se constrói através do caso de esterilização coletiva na Reserva Indígena Caramuru-Paraguaçu. O caso ocorreu quando o então candidato a Deputado Federal e médico, laqueou todas as mulheres da aldeia Bahetá por troca de votos. Nesse sentido, a presente pesquisa se debruça sobre a história da saúde indígena no Brasil e os desdobramentos da Lei de Planejamento Familiar e sua regulamentação feita no ano de 1996, assim como a questão legal do Planejamento Familiar nas comunidades indígenas. A pesquisa tem abordagem etnográfica, e tem como ponto de partida a Aldeia Velha, localizada no Arraial D’Ajuda, distrito de Porto Seguro. Tem com objetivos entender as dificuldades que as mulheres de aldeia velha encontram para fazer a a cirurgia de laqueadura; compreender todo o percurso burocrático para as indígenas conseguirem a laqueadura tubária através da SESAI. Para tanto, busquei elencar esse percurso sobre primeiro a ótica das mulheres indígenas e pela a ótica dos profissionais da saúde.

O presente estudo analisa o processo de transformações urbanas na cidade de Porto Seguro, a partir da construção da história da extinta Feirinha do Estádio. O objetivo da pesquisa é identificar as narrativas sobre a feira livre na cidade e os impactos do projeto de modernização urbana, que resultaram na extinção da feira no final da década de 2000. O que a feira livre do Estádio representava para os (as) feirantes, a população do seu entorno, a gestão municipal e a imprensa portosegurense? A partir dessa questão motivadora, buscou-se compreender a aplicação do projeto de reforma urbana na cidade e a depreciação da memória da feirinha e dos feirantes. O trabalho também analisa como o Estado e o setor do turismo articularam elementos simbólicos pautados no mito do descobrimento e nos referencias de sociedade nos aspectos de modernização, urbanização e higienistas do final do século XIX, para influenciar no desenvolvimento da cidade. Na análise considera-se também o contexto da primeira década dos anos 2000, caracterizado pelo grande desenvolvimento econômico, social e de redução da pobreza no país, além dos impactos da vinda da Copa do Mundo de futebol para o Brasil, esses fatores influenciaram no projeto de cidade que Porto Seguro deveria se tornar, já que o município como o Estado da Bahia beneficiaram-se com investimentos em infraestrutura, logo o intuito da pesquisa é identificar como o contexto histórico influenciou na reforma urbana, como a feira livre foi percebida nesse projeto e como estes elementos foram articulados com os interesses de setores hegemônicos, empresariais dentre eles o do turismo e mito de fundação da cidade.

Esta pesquisa teve como tema as formas de apropriação docente das tecnologias digitais de informação e comunicação na educação do campo. O objetivo foi identificar e analisar as formas de apropriação das tecnologias digitais na prática pedagógica de professores do campo, numa escola de contexto de luta pela/na terra do Extremo sul da Bahia. Esse trabalho se justifica tendo em vista o potencial de construção da autoria e produção dos sujeitos, buscando o empoderamento digital dos camponeses, de modo a garantir o acesso à cultura digital e a amenizar as desigualdades digitais. Esse estudo se alicerça teoricamente nos pressupostos de uma Educação do Campo popular pautada na práxis do trabalho, na pedagogia popular, na luta social e na organização coletiva (Frigotto, 2006, 2012; Miguel Arroyo, 2009; Caldart, 2000; MOLINA, 2014), além disso, se fundamenta nas críticas à cultura do Silêncio (FREIRE, 1976) e em diálogos com autores que discutem as TDIC para além do uso instrumental, de modo a inaugurar formas de pensar e sentir na interação com com a cultura digital (Bonilla, 2005; Bonilla e Halmann, 2011; Bonilla e Oliveira, 2011; Pierre Levy, 1999; Castells, 1999). O percurso metodológico desenvolveu-se sob a perspectiva do Materialismo Histórico Dialético e foi realizado um estudo de caso cuja abordagem foi qualitativa, em uma escola do campo sediada em um acampamento do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra — MST, localizado às margens da BR 101, próximo à cidade de Eunápolis no Extremo Sul baiano. Assim, buscou-se responder a seguinte questão de pesquisa: quais as formas de apropriação das tecnologias digitais na prática pedagógica de professores de uma escola de contexto de luta pela/na terra? Para tanto, foram realizadas entrevistas semi estruturadas, de modo a evidenciar as experiências vivenciadas pelos sujeitos da pesquisa quanto ao uso das tecnologias digitais no processo de ensino com os alunos. Os sujeitos da pesquisa são: um gestor, coordenador e os professores militantes que residem na comunidade. Os dados analisados resgatam o histórico da escola que demonstram uma forte resistência da comunidade na constituição e construção da escola no território. Além disso, foi recorrente nas narrativas dos sujeitos a constante tentativa de interferências administrativas da Gestão Municipal em diferentes momentos, desencadeando num processo de afastamento da escola com a pedagogia do MST, que revelam pontos de tensões entre os sujeitos. A pesquisa ainda discute as formas de apropriação docente das tecnologias digitais, a qual avança de forma morosa em decorrência, sobretudo, da escassez de recursos tecnológicos na escola, por outro lado, há um avanço contínuo das tecnologias móveis que chegam na escola através dos equipamentos pessoais de alunos e professores.

Uma nova perspectiva para as políticas públicas de desenvolvimento, a territorial, ganhou força na América Latina a partir da década de 1990, com um olhar especialmente voltado para superar a dicotomia rural-urbano, promover a inclusão socioprodutiva e considerar a participação social como um valor fundamental nesse processo. Considerando os esforços que vem sendo empreendidos para o enfrentamento da pobreza e das desigualdades por meio de políticas cuja unidade de planejamento e intervenção é o território e, adotando um quadro teórico que buscou integrar os aspectos institucionais e territoriais do desenvolvimento, este trabalho tem como problematização e propósito investigar as condições que interferem na constituição de capacidades institucionais e no desempenho do Colegiado de Desenvolvimento Territorial em direção a um processo de desenvolvimento no Território de Identidade Litoral Sul da Bahia, levando em conta sua formação e identidade territorial, as territorialidades estabelecidas, a existência de capacidades coletivas, o ambiente institucional e as restrições formais e informais. Os procedimentos metodológicos foram conduzidos mediante a utilização de técnicas de coleta e análise de dados predominantemente qualitativas, sendo um estudo de caso que teve como sujeitos da pesquisa representantes das entidades que compõem o Codeter Litoral Sul, cujo material obtido nas entrevistas constituiu a base para a análise qualitativa de conteúdo. Fundamentados nos relatos dos entrevistados, os resultados indicam que intervém sobre a constituição de capacidades coletivas e institucionais condições favoráveis associadas principalmente à atuação do colegiado territorial em dar voz e acesso aos grupos que historicamente ficaram à margem das políticas públicas. Também são apontadas potencialidades que podem induzir estratégias assentadas na valorização do sistema agroflorestal cacau-cabruca, da mata atlântica e de projetos socioambientais e produtivos baseados na diversidade cultural do território. Contudo, foram identificadas condições inerentes ao colegiado e outras determinadas pelo ambiente macro institucional que constrangem os esforços e estratégias de desenvolvimento. Portanto, embora o Codeter Litoral Sul seja reconhecidamente importante enquanto espaço institucional dentro do processo político-participativo, pesam sobre o seu desempenho condições restritivas muito expressivas, reforçadas não apenas pelo comportamento individualista e clientelista, traços atribuídos a identidade cacaueira, mas também, pelo sentimento de descrença no espaço institucional, pela fragilidade dos mecanismos de controle social, por sua condição subordinada aos interesses governamentais e pela falta de apoio governamental em suas três escalas de poder, especialmente pelo total desmantelamento da política de desenvolvimento rural e supressão dos espaços institucionais de participação logo após o golpe de 2016 no Brasil.

Apresenta-se aqui uma pesquisa sobre o Comitê das Bacias Hidrográficas dos rios Peruípe, Itanhém e Jucuruçu (CBHPIJ, aprovado pela Resolução CONERH 063/09), localizado no extremo sul da Bahia-Brasil. Objetiva-se compreender as razões pelas quais desde a sua efetiva implantação em 2012, o referido Comitê ainda não conseguiu evoluir rumo aos objetivos a que foi proposto. O recorte metodológico da investigação se limita às formas de gestão ambiental dentro do parlamento das águas, o CBHPIJ, envolvendo seu corpo diretivo e suas relações com os usuários, e os atores líderes das gestões municipais dos principais municípios da sua área de abrangência. Por intermédio de entrevistas diretas a estes atores buscou-se compreender os fatores e condições que distanciam o CBHPIJ do modelo ideal. A estratégia teórico-metodológica tem como pilar principal a Teoria dos Recursos Comuns elaborada por Elinor Ostrom (1990, 2007a, 2009), a qual culminou com a formulação de oito Princípios de Design presentes em todas as instituições robustas e resilientes no enfrentamento das questões ambientais. Seguindo esses princípios como modelo ideal foi montado um questionário para analisar o desenvolvimento institucional do sistema socioecológico da bacia do rio Itanhém. Esse procedimento permitiu comparar a realidade ao tipo ideal e, dessa forma, avaliar o quanto o Comitê se aproximou ou afastou do arranjo ideal de governança. Foram entrevistados quatorze membros da gestão, dez usuários de água, e 9 atores municipais das secretarias e conselhos de meio ambiente das cidades envolvidas pela bacia. Os achados da pesquisa revelam uma crise de confiança entre os usuários e o Estado; que o Comitê precisa ser reconhecido pela comunidade; que todos precisam conhecer seus limites e condições biofísicas dentro de um sistema claro de direitos e deveres; que precisam fazer valer a justiça e equidade das regras propostas cooperativamente caminhando em direção ao respeito da heterogeneidade da comunidade envolvida conforme suas diversas narrativas.

Esta tese, de abordagem transdisciplinar e apresentada em formato de coletânea de artigos, traz uma reflexão sobre as formas de inovação dos repertórios de ação participativos junto aos jovens indígenas Pataxó, assim como sobre os desafios da participação indígena no Brasil, diante do atual contexto político, de acentuada crise democrática e desmonte do sistema institucionalizado de participação. Destaca estratégias protagonizadas pelos povos originários, os quais buscam elaborar formas e espaços de organização autônomas, paralelas às formas institucionalizadas de interação, participação, diálogo e reivindicação perante o Estado, frente a uma exclusão secular e ao atual retrocesso da política indigenista brasileira. É sob esse pano de fundo em que são refletidas, à luz da experiência desses povos, as categorias teórico-analíticas que sustentam esta tese, a saber: democracia, participação e cidadania. Assim, analisa-se o movimento indígena da Bahia, buscando aproximar o olhar e a atuação do Povo Pataxó, em particular as formas de ação da sua juventude, a partir do estudo de caso etnográfico do Conselho da Juventude Pataxó da Bahia (CONJUPAB). Objetiva, na base teórico-prática dos espaços insurgentes, autônomos, autodeterminados e nãoinstitucionalizados, avançar na compreensão desse fenômeno e de outras dinâmicas parecidas na situação presente; extrair o que os movimentos em luta podem aprender com ele; e se e como essa experiência nos permite vislumbrar alguma contribuição com relação à superação da crise hoje instalada. Do ponto de vista epistemológico-metodológico, a pesquisa se referencia nos pressupostos das epistemologias críticas da investigação-ação feminista, na etnografia performática em condição de pesquisa engajada/implicada como método de pesquisa, e na “participação observante” como principal procedimento de coleta de informações, conjugado com entrevistas, questionários, análise de documentos etc. Como resultado de pesquisa, conclui-se que: a) o CONJUPAB se configura como uma alternativa e produto de inovação democrática, marcado como espaço de participação alternativo, inventado, não formal, livre e vivido, concebido não para sobre por as instâncias participativas institucionalizadas (IPs), mas para nelas se incluir, complementálas e democratizá-las; b) os Povos Indígenas, na observação da trajetória de participação do Povo Pataxó, experienciaram uma tortuosa e tardia inserção na arquitetura institucionalizada de participação, nos âmbitos federal, estadual e municipal, sinalizando fragilidades das IPs, mas também reconhecendo conquistas do processo, e o potencial de mudança social que essas representam; c) A resistência indígena caminha(rá) por múltiplas trincheiras de ação: por dentro das instituições políticas (instâncias governamentais nos três poderes e esferas); ocupando as instâncias participativas que restaram, e lutando pelo retorno das extintas, as quais têm negado a esses po vos o direito à participação/expressão; tonificando suas instâncias de diálogo, consulta e deliberação, e defendendo e promovendo as suas próprias formas organizativas; aglutinando estratégias de mobilização popular e ação coletiva para consolidação de uma frente unificada de luta dos povos em movimento. Os múltiplos e alternativos caminhos apontados pelos povos indígenas nesta pesquisa, além de animadores, podem contribuir para alargar nossos marcos de análise sobre as questões políticas da atualidade, assim como nos servir de inspiração e farol para a retomada de um projeto urgente de radicalização da nossa democracia.

A pesquisa está inserida nos estudos sobre patrimonialização dos monumentos negros, em específico, os terreiros. Nas últimas décadas algumas pesquisadoras iniciaram o movimento de verificar quais são as causas para a sub-representação do patrimônio negro enquanto patrimônio nacional, mesmo após a ocorrência do primeiro tombamento em 1984, ano do tombamento provisório, do Ilê Axê Iyá Nassô Oká. Partindo do campo do direito, da efetividade de direitos constitucionais, e em diálogo com outras áreas das ciências humanas e sociais, a tese abordará o estudo da Política de Preservação do Patrimônio dos Povos de Terreiro, com ênfase no Tombamento e Registro Especial de Terreiros de Candomblé, realizados pelo IPHAN e pelo IPAC, respectivamente. O objetivo geral da tese é analisar a efetividade jurídica da política pública de preservação do patrimônio cultural dos povos de terreiro executada no Estado da Bahia. São objetivos específicos: analisar como as religiões afro-brasileiras foram estudadas no processo de formação do campo “Estudos sobre os negros/Estudos sobre as religiões afro-brasileiras” e os possíveis diálogos com a sub-representação do patrimônio negro; analisar o processo de patrimonialização dos terreiros do Estado da Bahia com recorte em discussões nos Estudos do Sul (tombamento e registro); e, analisar o procedimento administrativo para o Registro Especial de terreiros no Recôncavo Baiano realizado pelo IPAC em 2014. A análise será realizada a partir de múltiplos métodos, quais sejam, revisão bibliográfica, pesquisa documental e etnografia dos documentos. Ademais, como caminho metodológico e epistemológico, a tese busca realizar diálogo com os Estudos do Sul, e apresentar um conceito sobre colonialidade que visa abordar as diferentes violências coloniais vividas pelos povos de terreiro.

O trabalho de tese ora apresentado tem os Pataxó da Terra Indígena (TI) Comexatibá, localizada no município de Prado (BA), como interlocutores e colaboradores. Embora a presença desse povo na região tenha sido amplamente descrita já no início do século XIX pelo viajante Maximiliano Maximiliano Wied-Neuwied, durante viagens que realizou entre 1815 e 1817, a luta pela retomada do território efetivamente só teve início a partir de 2000, no momento das comemorações oficiais dos 500 anos de Brasil. O reconhecimento só veio 15 anos depois, com a publicação do Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação (RCID) em 27 de julho de 2015. Tendo como corpus central, especialmente as histórias de vida de mulheres pataxó, a pesquisa não pretendeu de forma alguma desvendar ordens de funcionamento de suas comunidades, nem encontrar estruturas fixas agindo por trás de cada pequeno gesto mostrado por elas, antes historicizá-las como ações de sujeitos individuais e coletivos, como fatos sociais inseridos em espaços e tempos mais ou menos delimitados, sem fugir do que há de conflituoso, problemático e contraditório nelas. Essa tarefa estará ancorada em uma breve reflexão sobre memória, a partir de Aleida Assmann (2011), Joel Candau (2005, 2018), Maurice Halbawacks (2003) e Pollack (1989) em que esta será tratada como construção individual e coletiva, como terreno de disputas fundamentais na luta pelo território. Além disso também serão fundamentais as discussões das categorias tempo/temporalidade feitas por Paul Ricoeur (2006, 2007 e 2012), Johannes Fabian (2013) e Walter Benjamin (2012, 2013), que, de modos singulares, convidam a pensar o passado, o presente e o futuro como lugares políticos de criatividade e produção. Outras categorias importantes, como cultura, identidade e tradição serão iluminadas desde o pensamento de João Pacheco de Oliveira (1998, 2004, 2009 e 2016), Georges Balandier (1976), Homi Bhabha (2014), Alban Bensa (2016, 2006), Ulf Hannerz (1997), Edward Said (1990) e Jean Bazin (2008). Então, com o apoio desse referencial, bem como de documentos recolhidos durante a trajetória de pesquisa, é que será realizada a análise nomeada aqui de etnografia das narrativas, considerando que elas materializam uma certa perspectiva de tempo através de enredos, informações e imagens que dão conta de eventos desqualificados, silenciados, apagados e esquecidos no violento processo de colonização, tornado aceitável na narrativa oficial do país. Importante ressaltar que essas histórias não são meras recordações ou fonte de entretenimento, pois estão articuladas a processos políticos de resistência e luta, sobretudo das relacionadas ao território. Destarte, a pesquisa busca compreender e explicar como os Pataxó da T.I. Comexatibá organizam narrativamente suas experiências no tempo (temporalidade) e, fazendo-o, constroem-se como povo indígena com direitos legítimos sobre um território herdado de seus antepassados. Dito de outro modo, é preciso saber que soluções narrativas encontraram através dos tempos e no tempo para construírem a si mesmos na difícil empreitada das retomadas territoriais e étnicas, onde suas identidades são constantemente postas em xeque. Como resposta provisória, será possível afirmar que contar é fundamental para as lutas em curso, mesmo que seja através de temporalidades descontínuas, que não se encaixem em nenhuma das perspectivas temporais consagradas.

Este trabalho procura analisar a produção musical do MST e o lugar ocupado por ela dentro da organização, analisando sua contribuição nos processos de formação e evolução do movimento. Para tanto, analisamos as bases musicais que serviram de referência para a constituição das primeiras composições, a conjuntura política brasileira, elementos poéticos, rítmicos e geográficos. Da mesma maneira analisamos ao longo dos anos suas modificações, paralelas às modificações em outros setores da organização, dentre elas as pautas e reivindicações defendidas, as políticas governamentais e as relações com outros movimentos sociais. Ancoramos nosso referencial teórico em autores brasileiros que analisam diferentes estilos musicais através de uma ótica social e política, inferindo sobre eles modificações políticas e econômicas como: José Ramos Tinhorão (1991, 2017), Waldenyr Caldas (1999) e José de Souza Martins (1975). Ademais, também nos baseamos em livros, textos e relatorias do próprio movimento sem-terra e seus registros musicais como fitas K7, CDs, encartes e cartilhas musicais. Realizamos uma pesquisa bibliográfica e documental, ao passo que colhemos depoimentos de alguns militantes contando suas experiências e visões acerca dos diferentes processos musicais. Nossos resultados apontam a divisão de três diferentes estágios na música do movimento: produção interna, produção externa e expansão, ao passo que também identificamos diferentes funções exercidas pela música dentro da organização como a função de lazer e a função pedagógica.

Esta dissertação tem como objetivo verificar o alcance da interface social do Colegiado de Desenvolvimento Territorial da Costa do Descobrimento (CODETER) que é gerada com a implementação da Política Pública Territórios de Identidade (TI) promovida pelo estado da Bahia, onde duas questões: o Desenvolvimento Territorial Rural (DTR) e a Agricultura Familiar (AF) se inter-relacionam e como operam a modificações do Capital Social da AF do distrito rural de Vale Verde por meio desta Política Pública. Pretende-se analisar a multiatorialidade tanto de mediadores sociais como da AF na interface representada pelo CODETER, onde os diferentes atores sociais se relacionam com base em interesses, habitus e capitais diferenciados. Ao mesmo tempo analisar-se-á natureza relacional dos membros do CODETER em torno da questão do DTR e da AF. Por fim, considera-se como operam modificações no Capital Social dos AF do Vale Verde através desta Política Pública do TI, associado à análise da dinâmica rural deste distrito. No aspecto metodológico priorizou-se a delimitação do objeto de pesquisa, através de um recorte geográfico: na escala territorial, a Costa do Descobrimento e o distrito rural Vale Verde, na escala local. Aplicou-se um método de natureza empírico-dedutivo e qualitativo a partir da perspectiva de interface orientada para o ator. Durante o trabalho de campo, foram utilizadas técnicas primárias de coleta e análise de informações como entrevistas semi-estruturadas em profundidade, observação participante e viagens a campo. Seguiu-se, em linhas gerais, o protocolo de investigação estrutural-construtivista de Bourdieu. Conseguiu-se demonstrar que as questões do DTR e da AF, longe de se basearem em uma unidade e coerência de pensamento, são moldados em torno de esquemas fragmentados e articulados com base em conceitos-chave que adquirem diferentes significados e relações entre si segundo os enunciadores e seus contextos. A multiatorialidade que compõem o colegiado é muito diversa e expressa à diversidade do território, mas incompleta já que não envolve a todos os setores da sociedade. Isso seria a chave para pensar que na implementação da política de desenvolvimento territorial do estado da Bahia como uma política setorial com aspirações territoriais que não chega a ser pluri-setorial ao menos no TI pesquisado. Por ultimo, respeito os AF de Vale Verde além constatar a existência e a dotação de Capital Social de vários tipos resulta em uma escassa participação na política pública territorial.

Nas últimas décadas do século XX a atividade turística se desenvolveu de maneira bastante significativa na cidade de Porto Seguro, no sul do estado da Bahia, configurando o município como o segundo destino mais procurado do estado. A intensidade e a velocidade das recentes transformações sócio espaciais ocorridas em Porto Seguro, por si só, tornam a cidade um instigante tema de investigação sócio antropológica das quais diversas são as possibilidades de análise dessa realidade. Neste contexto, o destaque é dado para as grandes modificações que ocorrem no espaço urbano em função e através do turismo partindo de uma abordagem sociológica da atividade ao considerar elementos que vão para além da questão econômica, de modo a incitar reflexões acerca do turismo também como um fenômeno social dotado de dimensões políticas, sociais, ambientais e culturais. Diante disto vale pontuar como o crescimento da atividade turística na cidade, aliado à fatores como a pavimentação da BR-367, o processo de patrimonialização e as políticas públicas de turismo, além da migração regional em virtude da queda do ciclo do cacau em cidades próximas, fizeram com que a localidade se configurasse numa promessa de futuro e desenvolvimento local. Desse modo, evidencia-se como a prática do turismo, particularmente o turismo de massas, se constituiu em um elemento chave para as transformações urbanas ocorridas em Porto Seguro, sobretudo a partir da década de 1970 e intensificadas nos anos de 1990. Tais transformações têm provocado alterações na dinâmica da cidade e mudanças no espaço urbano que em última instância refletem também em como os residentes percebem e interagem com o espaço vivido, seja pela ótica espacial ou das relações sociais. Diante deste contexto, esta pesquisa objetiva assumir uma perspectiva ainda pouco desenvolvida nos estudos sobre turismo ao estudar os reflexos da prática da atividade turística no cotidiano de residentes da cidade de Porto Seguro através das percepções de moradores sobre o processo de turistificação do espaço urbano, privilegiando a visão da população local que tanto participou como também vivencia os desdobramentos dessas mudanças em seu cotidiano. A reflexão que se apresenta atenta para questões relacionadas à especialização do espaço voltada ao desenvolvimento turístico e os múltiplos efeitos relacionados à prática da atividade no cotidiano dos moradores de cidades turísticas.

Os conselhos de saúde são reconhecidos no Brasil como espaços para interação da sociedade com o Estado nas decisões políticas sobre o Sistema Único de Saúde, sendo uma importante inovação democrática que oferece oportunidade para que aqueles que usam os serviços do SUS participem do seu planejamento. A deliberação é o principal instrumento de negociação destes órgãos que tende a gerar decisões mais eficientes e mais democráticas, com vistas a possibilitar o caráter transformador e ativo dos conselhos. Contudo, a disseminação dessas instituições pelo país tem revelado alguns problemas, dentre eles, a real capacidade delas em operar e tomar decisões que se traduzam em práticas no âmbito da gest ão pública. Partindo desse contexto, buscou-se verificar a efetividade deliberativa do Conselho Municipal de Saúde de Teixeira de Freitas (CMS/TF) nos anos de 2018 e 2019 no que tange à sua função propositiva, a partir da compreensão do seu desenho institucional e do seu processo decisório, adotando-se para tanto, o modelo de análise desenvolvido por Faria (2007) e a base teórica-metodológica de Souza e Heller (2018). Dessa forma, a pesquisa foi desenvolvida em duas etapas distintas: pesquisa documental e pesquisa de campo. A primeira incluiu a análise de conteúdo das legislações que criaram e regulamentaram o CMS/TF, do seu Regimento Interno, bem como das atas e resoluções produzidas por ele no biênio citado. A segunda correspondeu às entrevistas semiestruturadas com os sujeitos que integram ou já integraram o espaço de interlocução do Conselho e, ainda, com a equipe técnica da Secretaria Municipal de Saúde. Verificou-se com este estudo que o Conselho Municipal de Saúde de Teixeira de Freitas encontra dificuldades para exercer o seu trabalho, cumprindo parcialmente o papel para o qual foi criado. Desta forma, apresentou grau médio de efetividade deliberativa, destacando -se como uma instituição que exerce, predominantemente, a função de controle sobre as políticas de saúde municipais. O estudo reconhece que, apesar do Conselho não ter se apresentado como propositor de políticas públicas, não deixa de ser um espaço importante para a deliberação, visto que se mostrou permeável à inclusão de vários atores sociais. Constatou-se que a superação dos obstáculos encontrados perpassa pela existência e valorização de um projeto político participativo pela gestão e pelo envolvimento daqueles que se comprometeram a exercer a função de conselheiro de saúde. Sugere-se, para estudos futuros, agregar outros elementos avaliativos para se obter informações sobre o destino das decisões, possibilitando verificar em que medida houve, de fato, a implementação das deliberações do CMS de Teixeira de Freitas no âmbito das políticas públicas de saúde do município.

A problemática central desta dissertação é oriunda da investigação do “Raid” a Porto Seguro no dia 3 de maio de 1939 e que se constituiu de uma atividade da aviação civil que iria aterrissar na cidade considerada como o lugar de origem da civilização brasileira O “Raid” foi um acontecimento aeronáutico-jornalístico que visava comemorar aniversário do “Descobrimento do Brasil”, por meio de uma viagem de resgate do berço da nação que apareceu em uma série de reportagens em jornais e revistas pertencentes aos Diários Associados, o conglomerado de imprensa comandado por Assis Chateaubriand. A comemoração das Asas do Brasil Novo vai promover atividades celebrativas que vão desde a anunciação da revoada, passando pela Caravana que reconfigura a paisagem do descobrimento em sua missão de hastear as bandeiras do Brasil e da Cruz de Cristo no Monte Pascoal, até chegar ao dia da realização do evento que contaria com cerimônias e performances que se constituiriam nas alegorias do descobrimento que marcaram presença Sob os céus de Porto Seguro. Os dispositivos de emolduramento oriundos da análise dos desdobramentos da carta de Caminha estariam presentes nos processos de invenção do descobrimento a ser reativado pela teatralização alegórica que a festa de brasilidade agencia como forma de por em marcha do processo civilizador que mascara a emergência de uma virtude civilizatória. Toda essa problemática estaria entremeada pelas ordens do tempo – cultura histórica, comemoração e patrimônio – que configurariam o horizonte de atuação destes que buscaram celebrar os 439 anos do Brasil por meio desta viagem de redescobrimento durante o Estado Novo.

A presente pesquisa tem por objetivo analisar os impactos da implementação de políticas de segurança públicas na Bahia, especificamente, no bairro Baianão em Porto Seguro (BA). Este estudo tem como indicadores os índices de criminalidade relacionados com os Crimes Violentos Letais Intencionais (CVLI) e sua relação com a criação da Base Comunitária de Segurança (BCS) do Baianão implantada em 2013. O trabalho propõe investigar os efeitos da dinâmica da mobilidade do crime, no território do município, advindos da existência da BCS na referida localidade. Para tanto, a pesquisa trata, inicialmente, das discussões teóricas das relações entre o Estado Moderno, o uso e controle da força, em perspectivas sociológicas da violência e Segurança Pública, e de como as políticas públicas se inserem nesses processos. Metodologicamente, a pesquisa possui caráter bibliográfico-interpretativa e dedutiva, uma vez que se ancora em um conjunto de dados oficiais já consolidados em nível nacional, regional e municipal. Sendo assim, traça-se como etapas da pesquisa: a) descrição e interpretação dos dados bibliográficos oriundos de diferentes fontes oficiais, nomeadamente, do Instituto de Pesquisa Aplicadas (IPEA), da Secretaria de Segurança Pública do Estado da Bahia e da Polícia Civil da Bahia (SSP-BA); b) análise comparativa dos dados oficiais constantes nos arquivos das Delegacias da Policia Civil de Porto Seguro e dos registros do Sistema Integrado de Gestão da Polícia Militar (SIGPM) da Bahia entre os anos de 2011 a 2015.  Por conseguinte, a pesquisa pretende evidenciar que a elaboração de políticas de Segurança Pública acarreta, em maior ou menor grau, mudanças na dinâmica do crime a nível local e regional, verificando a hipótese de que a criminalidade possui menos flutuantes em relação a áreas específicas do território municipal. Para isso tomamos a Base Comunitária de Segurança do Baianão como exemplo desse processo.  

As atividades econômicas organizadas coletivamente pelos trabalhadores em que os mesmos se associem e pratiquem uma autogestão de seus empreendimentos e negócios abarcam o conceito de economia solidária. Dentre as Políticas Públicas de incentivo à Economia Solidária no Brasil, em especial a Bahia, merece destaque a Política Pública de Assistência Técnica e Inclusão Socioprodutiva por ser essa uma política inovadora e que oferece um suporte através dos centros públicos que visam promover, dinamizar e fortalecer os empreendimentos solidários na Bahia. Esse estudo, de natureza exploratória e descritiva, teve como objetivo investigar se o empreendedores solidários cadastrados na Rede Mata Atlântica do Território perceberiam como efetiva a Política Pública de Assistência Técnica e Inclusão Socioprodutiva, assim como o trabalho de assistênciatécnica prestada pelo centro público para o desenvolvimento, crescimento e sustentabilidade de seus empreendimentos. Especificamente, pretendeu-se mapear os tipos de empreendimentos solidários do território e investigar se os municípios que compõem esse território difeririam entre si no que diz respeito à percepção da efetividade da política pública em questão e da assistência técnica prestada. Finalmente, buscou-se verificar se haveria efeitos do tipo de empreendimento, da zona de atuação, do tipo de atividade, do destino do produto sobre essas percepções de efetividade. Para isso, a metodologia utilizada foi de natureza quantitativa, uma vez que fez uso de levantamento de dados secundários e lançou mão de uso de instrumento padronizado para a coleta dos dados primários junto a 80 empreendedores solidários. Os dados foram tabulados e analisados por meio da estatística descritiva e inferencial, com o uso do programa estatístico SPSS. Os resultados indicaram que de maneira geral, os atores sociais envolvidos com as atividades solidárias apontam índices de satisfação em relação a efetividade das ações do Governo do Estado em relação à política executada, bem como em relação ao trabalho desenvolvido pela CESOL, principalmente as ações que dizem respeito à comercialização, através dos incentivos voltados a implementação do Espaço Solidário, Feiras e Eventos e as feiras semanais. Contudo, as percepções da efetividade da política e do trabalho do centro público apresentaram diferenças entre os municípios e os grupos pesquisados que fazem parte dos empreendimentos da rede, o que reflete que, apesar dos municípios e grupos fazerem parte de um único Território de Identidade as realidades locais e dos grupos de atividades devem ser levadas em consideração quando da aplicação das ações, incentivos e fomento por parte do Governo do Estado em relação à política pública estudada. O estudo possibilitou a identificação de possíveis potencialidades e desafios que precisam ser reconhecidos pelos centros públicos, contribuindo para a discussão acerca avaliação da própria Política de Assistência Técnica e Inclusão Socioprodutiva na Rede de empreendimentos da região, contribuindo com o debate em torno da temática da economia solidária e oferecendo respostas que possam subsidiar ações de intervenções públicas para o fortalecimento dos empreendimentos solidários da região do Baixo Sul Baiano.

O presente trabalho investiga o fenômeno da morte da criança e busca apresentar uma compreensão possível de como tal experiência desvela modos de pensar a interação criança e mundo. A relação com a morte é, de início e na maioria das vezes, tomada a partir da negação, que se dá diante da impossibilidade de experimentar o fenômeno da própria morte. De quais maneiras o fenômeno da morte da criança pode desvelar modos de pensar criança-no-mundo? A Psicologia Fenomenológico-existencial, com a filosofia de Heidegger, vem recentemente tematizando a criança. Como hipótese, numa perspectiva fenomenológico-existencial e no pensamento heideggeriano, o tema do cuidado nos permite pensar as vivências do fenômeno da morte como mobilizadoras de distintos modos de ser-com-a-criança-no-mundo, que estavam até então velados. A pesquisa, de caráter qualitativo e exploratório, terá como fio condutor a fenomenologia como método de investigação. Visando alcançar o horizonte histórico, buscaram-se autores relevantes que estudaram a morte e a criança na perspectiva fenomenológico-existencial. A pesquisa se dividirá em etapas: a primeira traz a discussão de morte no pensamento Heideggeriano; a segunda trará a perspectiva da Psicologia existencial da morte da criança; por fim, a terceira consistirá na realização das entrevistas fenomenológicas, com transcrição detalhada e análise sob a ótica do método fenomenológico de investigação em Psicologia . Criança e morte remetem ao
tempo, temporalidades. Uma é abertura e outra fechamento. Será possível refletir sobre a possibilidade desse encontro? Para essa resposta, ou qualquer outra que se apresente, será preciso serenidade, pois talvez seja possível encontrá-la ao fim e ao cabo desta investigação.

Nesta dissertação, são analisados dois romances de Jorge Amado: Terras do Sem-Fim e Gabriela, cravo e canela: crônica de uma cidade do interior, a fim de entender o processo de construção da identidade da antiga região cacaueira do Sul da Bahia, hoje denominada microrregião Itabuna-Ilhéus. A partir de uma perspectiva pós-colonial, a pesquisa se propõe a identificar as características dos sujeitos das sociedades itabunense e ilheense nessas duas obras, e contextualizá-las com os aspectos literários do período em que foram escritas e publicadas pela primeira vez. Utilizo como método a Análise do Discurso, identifico as principais formações discursivas e suas respectivas formações ideológicas com as quais o escritor tece a identidade dos sujeitos e da região em questão, analisando o texto e o contexto histórico, literário e científico em que os dois romances estão inseridos. São apresentadas aqui as imbricações entre questões de raça, classe e gênero, percebendo o campo social de onde o escritor constrói suas narrativas que ajudam a tecer a identidade nacional e a identidade da região cacaueira, sobre os sujeitos que a habitam.

Os instrumentos de comando-e-controle não têm se mostrado suficientes para conter a
destruição do meio ambiente. O aumento do desmatamento, a poluição das águas, a
piora da qualidade do ar, a redução da biodiversidade, o aumento da temperatura global
e os crimes ambientais como o rompimento de barragens e vazamentos de petróleo são
demonstrativos claros de que as atuais medidas são incipientes. Cientes disto, países
ao redor do globo vêm aplicando instrumentos econômicos que conduzem
comportamentos ambientalmente adequados na tentativa de contribuir com a
preservação. Dentre estes instrumentos possíveis está a tributação ambiental, através
da utilização do caráter extrafiscal dos tributos, fazendo com que poluidores sejam
estimulados a adotar comportamentos ambientalmente mais adequados em troca de
economia tributária ou, caso contrário, tenham um incremento em sua taxação. Este
trabalho traz a evolução do instituto da tributação ambiental desde a sua origem nas
teorias econômicas, a origem do princípio do poluidor-pagador e seus desdobramentos,
até desaguar no direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado
garantido na Constituição. Na sequência aborda a dificuldade de se adotar a tributação
ambiental no Brasil e, dentro deste cenário de restritividade, o que é possível se fazer
para dar caráter verde e se inserir a variável ambiental na tributação municipal de Porto
Seguro, buscando, apesar das limitações, conduzir comportamentos ambientalmente
mais adequados dos cidadãos. Por fim, como apêndice, apresenta um modelo de
projeto de lei municipal que altera o Código Tributário Municipal, incluindo a variável
ambiental na lógica tributária do município de Porto Seguro, estado da Bahia.

Este estudo pautou-se em identificar e analisar as marcas do eurocentrismo na construção da (s) identidade(s) corporal(is) das adolescentes indígenas de um colégio de Ensino Medio de Porto Seguro-BA. A pesquisa foi de cunho etnográfico com enfoque qualitativo. Ancorada em referenciais teóricos que atravessaram temas como: o espaço escolar, a crítica ao eurocentrismo, a adolescência e a adolescência indígena, o corpo na perspectiva filosófica e sociológica e o currículo. Os procedimentos metodológicos utilizados foram a aplicação de questionário sócio demográfico e lista de questões norteadoras para discussão com o grupo focal com as adolescentes. Para analisar os dados obtidos, foi utilizada a Análise Textual Discursiva(A.T.D.). A análise e interpretação dos dados, desvelou-nos de que maneira o eurocentrismo persiste na construção da(s) identidade(s) corporal(is) das adolescentes indígenas. Percebemos ao analisar os dados que o ranço eurocêntrico persiste desde a opção em usar o fardamento exigido pelo Estado em detrimento do uso do traje indígena até o ideal de beleza ocidental vislumbrado por esses corpos adolescentes. As considerações finais anunciaram a necessidade de descolonizar o currículo, as práticas pedagógicas dos componentes Educação Física e Educação Corporal, bem como, inserir debates e discussões que problematizem sobre o corpo adolescente feminino no espaço escolar indígena.

Esta dissertação tem por objetivo investigar a participação do Movimento Nacional da População de Rua (MNPR) no processo de construção da Política Nacional da População em Situação de Rua (PNPR) no Brasil. Com isso, busca-se compreender a contribuição do movimento para a democratização do acesso a direitos e a visibilidade social e política desse grupo populacional. A pesquisa se desenvolve a partir da análise de publicações produzidas pelo próprio movimento ou como resultado de sua participação em processos de iniciativa do Estado. São considerados dois períodos: de 2005 a 2009, com documentos produzidos em âmbito federal, e de 2010 a 2016, com material produzido no âmbito do estado da Bahia, em função do protagonismo que o movimento assume neste estado. A análise se apoia em referencial teórico dedicado ao estudo de políticas públicas, com ênfase em políticas sociais (CARDOSO JR, 2005; SILVA, M., O.,2008), participação (DAGNINO, 2002; GOHN, 2015; WAMPLER; AVRITZER, 2004) e trabalhos voltados especialmente à temática da população em situação de rua (PSR) (ROSA, 2005; SILVA, M. L., 2009; SNOW; ANDERSON, 1998; STOFFELS. 1977). Além disso, se fundamenta na legislação dedicada ao tema no Brasil. Os principais resultados da pesquisa indicam a força de articulação da PSR em torno de representações com condições de negociar e pressionar o Estado; sua inserção institucional no processo de construção da Política Nacional, influenciando o desenho das ações e programas, a fim de que tais iniciativas atendam às reais demandas deste público; e a produção de novos saberes sobre a população em situação de rua, com vistas ao seu reconhecimento social e jurídico.

A presente pesquisa pretende indagar as noções de infância e trabalho instigada pela experiência vivenciada no projeto social Mais Nordeste: Mais Educação, Cultura e Direitos desenvolvido pela organização não-governamental Gerando Vida, no bairro periférico Alecrim II, na cidade de Eunápolis, extremo sul da Bahia, no período de 2015 e 2016. O tema principal que a experiência traz à tona –o trabalho infantil –é abordado correntemente a partir de uma perspectiva normativista que por vezes, ao supervalorizar os dados quantitativos que visam mensurar o fenômeno, tende a desconsiderar outras visões de mundo, os valores e subjetividades dos sujeitos diretamente envolvidos. Escolhi buscar outro caminho de exploração e de análise, uma trajetória intelectual que se inicia na normatividade e na reprodução do discurso hegemônico e que, no decorrer da pesquisa, a partir de novas fontes bibliográficas e reflexões mais críticas e aprofundadas sobre a temática o estudo começa a se afastar da primeira perspectiva e se aproximar de uma visão epistemológica que compreende o complexo na análise do fenômeno social. A partir de uma revisão histórica sobre a construção social do que compreendemos ser a infância e do reconhecimento de que existem diferentes concepções de “infâncias” no contexto brasileiro, este estudo busca compreender os processos de consolidação do domínio e da superioridade de uma possibilidade de se viver a infância sobre outras, processo este de aproximação e distanciamento entre a infância e o trabalho, que se reflete nas normas legais, em âmbito internacional e interno, e na política pública local no decorrer do tempo. O trabalho apresenta a partir de dados estatísticos oficiais e das produções acadêmicas e legislativas um conjunto de entendimentos e normas legais que se constituíram sob o posicionamento em prol da erradicação do trabalho na infância. Diante da irregularidade e complexidade que envolve o estudo do fenômeno, a proposta de uma compreensão reflexiva e transdisciplinar horizontaliza o olhar sobre as diferentes interações no espaço social e atrai para o campo teórico outros sentidos possíveis sobre as noções de infância e trabalho. Os processos de construção de sentido relacionam-se a distintos modos de vida e a incompreensão daqueles acaba por deslegitimar estilos de vida distintos, fortalecendo uma relação de poder vinculada a um discurso que exprime a visão de mundo das classes dominantes. Desta forma, como estas outras concepções poderiam se configurar enquanto saberes geradores de novas reflexões e formulações no campo teórico e prático, nas normas legais e no planejamento e formulação de políticas públicas sobre o trabalho infantil? Para persecução dos objetivos será utilizado o método qualitativo a partir de uma perspectiva fenomenológica, que perspectiva utilizada será a fenomenologia que se baseia noponto de vista dos sujeitos sobre a realidade construía nomundo cotidiano. As técnicas utilizadas serão a pesquisa bibliográficae documental, com consulta de livros, periódicos, dissertações e teses, dados estatísticos oficiais e dados institucionais da ONG Gerando Vida. Os resultados esperados visam possibilitar novas reflexões e formulações no campo teórico, a partir da inclusão dos olhares dos sujeitos envolvidos no fenômeno, e também no campo prático, servindo como guia de ação em atividades sociais, públicas e privadas, que envolvam crianças e adolescentes.